A legislação disciplinar dos advogados assenta no Estatuto da Ordem dos Advogados
A deontologia do advogado consiste num conjunto de regras de comportamento, assente nos costumes e na moral, que regula o exercício da profissão. Este conjunto de regras é essencialmente de natureza ética. Daí que os princípios mais relevantes da deontologia são a independência, a dignidade, a probidade, a isenção, o respeito pela verdade,
Este conjunto de regras desdobra-se em deveres
Para atingir este desiderato, o advogado deve ser e permanecer independente assim como cumprir certos deveres para com a comunidade. Também se deve atualizar permanentemente. Só assim atuará com a adequada diligência e técnica.
O advogado está sujeito ao segredo. Este dever impõe-se em todas as circunstâncias e abrange todos os factos de que tenha conhecimento no exercício da sua profissão ou por causa dela.
O advogado poderá, no entanto, ficar autorizado a divulgar factos abrangidos pelo segredo profissional desde que tal seja absolutamente necessário para a defesa da dignidade, direitos, interesses legítimos do próprio advogado ou do cliente ou seus representantes. Para isso necessita de prévia autorização do presidente do Conselho Regional respetivo.
Recai sobre o advogado o dever de não se pronunciar publicamente na imprensa ou noutros meios de comunicação social sobre questões profissionais pendentes. Exceciona-se a este dever as situações em que o presidente do Conselho Regional o autorizou a fazê-lo, nomeadamente quando está em causa a ofensa à dignidade, direitos e interesses legítimos do cliente ou do próprio.
O advogado também deve cumprir as regras relacionadas com a publicidade. A mais relevante talvez seja a de a divulgação da sua atividade profissional ter de ser efetuada de forma objetiva, verdadeira e digna, além de ter de cumprir com as normas legais sobre publicidade e concorrência. A publicidade, por isso, deve ser meramente informativa, impedindo-se que seja garante de resultados ou enganosa.
O advogado ainda tem um dever geral de urbanidade. Ele deve proceder com urbanidade nomeadamente para com os colegas, magistrados, árbitros, peritos, testemunhas e demais entidades nos processos e ainda oficiais de justiça, funcionários notariais, das conservatórias e de outras repartições ou entidades públicas ou privadas. Daí que, quando entende estar em condições de patrocinar alguém contra um colega ou um magistrado deve antecipadamente comunicar por escrita essa intenção, com explicações que entender necessárias, exceto se estiver perante processos que tenho natureza secreta ou urgente.
O advogado, estando obrigado a prestar os seus serviços de acordo com a deontologia profissional, deve assumir uma atitude responsável perante o cliente, os colegas e a comunidade sempre com a adequada independência técnica e liberdade. Daí que deve recusar o patrocínio de uma questão em que se encontra em conflito de interesses, deve dar a sua opinião conscienciosa sobre as questões que lhe são colocadas, tratar de forma autónoma os fundos que recebe por conta dos seus clientes, solicitar honorários dignos que correspondam a uma compensação económica adequada para o serviço efetivamente prestados assim como está proibido de aceitar pactos de quota litis.
Processo disciplinar do advogado
Os advogados devem cumprir as normas deontológicas que regem o exercício da sua atividade.
Não o fazendo, cometem uma infração disciplinar, do qual resultará a aplicação de uma sanção.
Tipos de infrações:
As infrações disciplinares podem ser punidas a título de dolo ou de negligência.
Significa isto que, para haver infração disciplinar, tem de haver culpa.
Existem determinadas situações que excluem a culpa.
São as previstas na lei penal.
A lei também estabelece os critérios de graduação para aplicação das sanções. Terá de se ter em consideração os antecedentes profissionais e disciplinares do advogado, o grau de culpa, a gravidade as consequências da infração, as circunstâncias económicas do arguido e todas as demais circunstâncias agravantes ou atenuantes.
Existem determinadas circunstâncias atenuantes, como por exemplo, exercer a advocacia por um período superior a cinco anos sem qualquer sanção, a confissão, a colaboração do arguido para a descoberta da verdade e ainda a reparação espontânea pelo arguido dos danos causados pela sua conduta.
Também se encontra previsto a possibilidade de se aplicar ao advogado sanções acessórios.
Poderá ser a restituição de honorários ou a publicidade da sanção.
Por sua vez, também existem circunstâncias agravantes.
São elas, a verificação de dolo, a premeditação, o conluio, a reincidência, acumulação de infrações, entre outras.
i) Quem está sujeito ao código deontológico
Todos os advogados estão sujeitos a responsabilidade disciplinar, independentemente da natureza contratual sob a qual exercem a sua atividade. Isso significa que mesmo que o advogado cancele ou suspenda a sua inscrição, continua a ser responsável pelos atos praticados antes dessa suspensão ou desse cancelamento.
ii) Processo disciplinar
O processo disciplinar pode comportar duas formas: inquérito e o processo disciplinar propriamente dito. Existem princípios que se aplicam a ambos os processos assim como existem outras regras se aplicam apenas a cada um deles. Obviamente que o mais importante é o processo disciplinar propriamente dito. O processo de inquérito ocorre em determinadas situações quando são necessárias diligências sumárias para esclarecer os factos que chegaram ao conhecimento do Conselho.
a) Participação e fase inicial
O processo disciplinar inicia-se com uma participação dirigida à Ordem dos Advogados. Se não existir participação, o presidente do conselho disciplinar competente pode determinar a abertura desse processo.
Nessa participação, o queixoso deve mencionar os factos suscetíveis de constituir infração disciplinar.
É admitida desistência da participação pelo interessado. Se for o caso, ela extingue-se, salvo se a infração afetar a dignidade do advogado visado e este pretender continuar o processo, ou afetar o prestígio da o Ordem ou da profissão.
Chegando o processo ao órgão competente, ele pode pronunciar-se liminarmente e, sendo manifestamente improcedente, recusar a ação disciplinar. Isso poderá acontecer quando a Ordem dos Advogados não é a entidade competente para apreciar os factos relatados ou, por exemplo, quando os factos referidos não têm qualquer relevância deontológica.
O processo disciplinar segue os seus termos quando o que é relatado são indícios da prática de uma infração disciplinar. A instauração do processo não origina qualquer pré-juízo de culpa, na medida em que o advogado beneficia da presunção legal de inocência até prova em contrário.
Atenção ao tema da prescrição. Pode ocorrer prescrição do ilícito, prescrição do procedimento e até prescrição da sanção. Para isso é importante saber em que data ocorreram os factos que suportam os indícios relatados e que sustentam o processo disciplinar. Também é importante compreender que este prazo de prescrição pode ficar suspenso ou pode ser interrompido.
Além disso, também se pode verificar a extinção do direito de queixa.
b) Instrução e acusação ou arquivamento
Depois de nomeado, é ao relator que compete incentivar o andamento da instrução do processo. Esta Instrução é sumária devendo ser recusado tudo aquilo que for impertinente, inútil ou dilatório.
Nesta fase, é possível ao relator convocar uma reunião entre o participante e o participado tendo em vista um acordo.
Nesta fase de instrução é obrigatório que o advogado arguido seja notificado para tomar conhecimento da participação e para se pronunciar, se assim o desejar.
A instrução consiste num conjunto de atos que tem em vista carrear prova para o processo de maneira a que se permita concluir que há uma forte probabilidade de a acusação ser dada como provada e o participado condenado na prática do ilícito disciplinar. É admitida toda a prova permitida em direito. Estamos a falar de prova testemunhal, documental, relatórios, perícias, fotografias, comunicações entre outras. Esta prova pode ser requerida e/ou apresentada tanto pelo participante como pelo advogado.
Finda a instrução o relator profere despacho de acusação, quando considera que existem fortes indícios da prática da infração, ou elabora proposta de arquivamento, ou que o processo fique a aguardar produção de melhor prova.
A acusação deve preencher determinados requisitos. Deve ser articulada e especificar a identidade e demais elementos pessoais relativos ao arguido, os factos imputados e as circunstâncias em que eles foram praticados, as normas infringidas e o prazo para a apresentação de defesa.
Esta acusação deve ser dada a conhecer ao arguido.
Pode ser ordenado, com a acusação, a suspensão preventiva do advogado.
c) Defesa
O advogado terá 20 dias para se defender. Durante este período, o advogado pode consultar o processo na secretaria ou pedir a sua confiança para o consultar no seu escritório. Para o efeito, o relator terá de se pronunciar sobre esse pedido.
O participado pode constituir advogado em qualquer fase do processo. Em particular, neste momento, que é muito importante.
Na defesa, que tem de ser feita por escrito, o advogado deve expor claramente os factos, o seu entendimento e os motivos pelos quais considera inexistir a prática de facto ilícito disciplinar. Com a defesa, o arguido deve ainda apresentar a sua prova nomeadamente o rol de testemunhas e documentos que considere relevantes bem como pode pedir a realização de outras diligências. O total das testemunhas não pode exceder as 10. É também este o momento em que o advogado , se assim o desejar, pode requerer a realização de audiência pública para ser julgado.
d) Decisão
Realizadas as diligências de prova, o relator vai então elaborar um relatório final, devidamente fundamentado, do qual constem os factos apurados a sua qualificação e gravidade, a pena que entende dever ser aplicada ou a proposta de arquivamento do processo.
Se o advogado solicitou julgamento em audiência pública, então esta deve ser realizada no prazo de 30 dias a contar da notificação do relatório final. Pode ser apresentado a prova complementar requerida pelo participante ou pelo arguido e esta deve ser imediatamente oferecida e produzida perante os membros do conselho disciplinar. Finda a produção da prova é dada a palavra ao participante, ao arguido ou aos respetivos mandatários para alegações orais. Encerrada a audiência, o conselho reúne para deliberar, lavrando acórdão.
e) Sanção disciplinar
As sanções previstas são a advertência, a censura, a multa, suspensão até um máximo de 10 anos e a expulsão.
A advertência é aplicada ao membro que comete fração com culpa leve, e tem por finalidade evitar a repetição da conduta lesiva.
A censura é aplicável às infrações leves, mas para as quais, em razão da culpa do arguido, já não seja bastante a advertência.
A multa é fixado em quantia certa em função da gravidade e das consequências da infração cometida sendo aplicável às infrações disciplinares graves, e consiste no afastamento total do exercício da advocacia durante o período de aplicação da sanção.
A expulsão exige deliberação que tenha a maioria de 2/3 dos votos de todos os membros efetivos do conselho e é aplicável a infrações disciplinares muito graves que põe em causa a integridade física, a vida, ou lesem de forma muito grave a honra ou o património alheio ou valores equivalentes.
A sanção disciplinar é determinada considerando os antecedentes profissionais e disciplinares do arguido, o grau de culpa, a gravidade e as consequências da infração e todas as demais circunstâncias agravantes ou atenuantes.
Como já vimos, existem determinadas circunstâncias atenuantes, como por exemplo, exercer a advocacia por um período superior a cinco anos sem qualquer sanção, a confissão, a colaboração do arguido para a descoberta da verdade e ainda a reparação espontânea pelo arguido os danos causados pela sua conduta.
Por sua vez, também existem circunstâncias agravantes. São elas o dolo, a premeditação, o conluio, a reincidência, acumulação de infrações, entre outras.
f) O recurso para o Conselho Superior
Das decisões tomadas em matéria disciplinar pode recorrer-se para o Conselho Superior. Têm legitimidade para o efeito o arguido, os interessados e o bastonário. O prazo para interposição dos recursos é de 15 dias a contar da notificação da decisão final, ou de 30 dias a contar da a fixação do edital. Estes recursos tem efeito suspensivo.
O requerimento de interposição do recurso é sempre motivado, mediante alegações escritas, sob pena de não admissão do mesmo, sendo, para tanto, facultada ao recorrente a consulta prévia do processo.
Com a motivação, que deve enunciar especificamente os fundamentos do recurso e terminar com a formulação de conclusões, pode o recorrente requerer a junção dos documentos que entenda convenientes, desde que os mesmos não pudessem ter sido apresentados até à decisão final objeto do recurso.
O recurso não é admitido quando a decisão for irrecorrível, quando for interposto fora de tempo, quando o recorrente não preencher as condições necessárias para recorrer ou quando não vier acompanhado de alegações que o fundamentem.
Admitido o recurso que subir imediatamente, é notificado o interessado ou o órgão participante para responder no prazo de 15 dias, sendo-lhe facultada a consulta do processo.
Pode ser apresentada prova complementar mas desde que a mesma não pudesse ter sido apresentada até a decisão final.
A outra parte que não apresentou recurso é notificada para responder no prazo de 15 dias.
Depois é elaborado um relatório que deve cumprir com os requisitos da decisão final quando o processo ainda estava no conselho Regional.
g) Recurso judicial
Da decisão do conselho superior pode ser objeto de recurso para os tribunais administrativos. Inicia-se depois um processo judicial que pode levar a confirmação ou não da decisão proferida pelo conselho superior.