O recente apagão que afetou diversas áreas levanta, inevitavelmente, questões sobre os direitos e deveres de trabalhadores e empregadores em Portugal, particularmente no que concerne à remuneração de um dia de trabalho não totalmente prestado devido a uma circunstância alheia à vontade de ambos.
Em situações de interrupção no fornecimento de energia elétrica de grande escala, como um apagão, a impossibilidade de prestar trabalho pode surgir para muitos colaboradores. A questão que se coloca é se, nestes casos, o empregador pode ou não descontar o dia de trabalho não realizado.
É importante sublinhar que a legislação laboral portuguesa não prevê uma disposição específica e detalhada para a situação particular de um apagão generalizado. Contudo, existem princípios e normas gerais que podem ser aplicados por analogia e que merecem ser considerados.
De grosso modo, o contrato de trabalho pressupõe a prestação de trabalho por parte do trabalhador e a correspondente retribuição por parte do empregador. A ausência ao trabalho pode, em certas circunstâncias, justificar a perda da retribuição correspondente. No entanto, quando a impossibilidade de trabalhar decorre de um evento imprevisível e inevitável, como um apagão de grande dimensão, a situação pode ser vista de forma diferente.
Alguns argumentam que, nestas situações, a ausência ao trabalho não seria imputável ao trabalhador, mas sim a uma circunstância de força maior que afeta a capacidade de funcionamento da própria empresa. Nestes casos, descontar o dia poderia ser considerado injusto.
Por outro lado, os empregadores podem invocar o princípio de que a retribuição é devida pela prestação efetiva de trabalho. Se o trabalhador não pôde trabalhar devido ao apagão, mesmo que por uma razão externa, a obrigação de remunerar poderia ser questionada.
É crucial referir que a forma como esta situação é gerida pode depender de diversos fatores, incluindo:
- A duração do apagão: Uma interrupção breve pode ter um tratamento diferente de um apagão que se prolongue por todo o dia de trabalho.
- A possibilidade de realizar trabalho alternativo: Se o trabalhador puder desempenhar outras tarefas, mesmo sem energia elétrica, a situação pode ser diferente.
- Acordos individuais ou coletivos: Existência de contratos de trabalho ou convenções coletivas de trabalho que prevejam situações de suspensão do trabalho por motivos de força maior.
- A política da empresa: Algumas empresas podem optar por abonar o dia de trabalho nestas situações como um gesto de boa-fé e reconhecimento das circunstâncias.
Em suma, a questão do desconto do dia de trabalho em caso de apagão não tem uma resposta simples e direta na legislação laboral portuguesa.
A análise deve ser feita caso a caso, considerando os princípios gerais do direito do trabalho e as circunstâncias específicas da situação. Recomenda-se cautela na tomada de decisões unilaterais, sendo preferível o diálogo entre empregadores e trabalhadores ou a consulta a especialistas em direito do trabalho para evitar potenciais litígios.